Lei Seca: em 10 anos, mortes no trânsito caem 14%, mas fiscalização precisa melhorar

Há 10 anos era sancionada a lei 11.705, mais conhecida como Lei Seca. Desde que foi aprovada, em 2008, a legislação fiocu menos tolerante com quem dirige e ingere álcool, impondo mudanças no comportamentos dos motoristas e ajudando a reduzir mortes no trânsito. Dados do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, indicam que houve uma redução em mais de 14% do número de mortes por acidentes de trânsito no país. Em 2008, quando a lei foi implementada, o SIM registrou 38.273 óbitos por essa causa. Em 2017, dados preliminares, já apontam a queda para 32.615 casos.

Em quase 10 anos, a nova legislação evitou a morte de 40.700 pessoas e a invalidez permanente de outras 235 mil. Essa é a projeção feita pelo Centro de Pesquisa e Economia do Seguro (CPES), órgão da Escola Nacional de Seguros.

“Se não fosse a Lei Seca, os acidentes teriam provocado perdas mais acentuadas de vidas humanas e também econômicas. O endurecimento das penas e a fiscalização contribuíram para evitar uma tragédia de proporções ainda maiores. Foi verificado que a punição mais severa tem impacto direto na violência do trânsito”, afirma a economista Natália Oliveira, que coordenou o estudo.

Apesar dos resultados positivos, especialistas acreditam que a fiscalização não pode ser afrouxada. “O maior problema do trânsito brasileiro ainda é a falta de fiscalização. A transgressão das leis afeta todas as classes sociais – e o cumprimento de regras só funciona mediante punições. É uma questão de exemplos, de cidadania. As pessoas não têm medo de morrer, mas têm medo de pagar multas”, afirma Natália.

Essa também é a posição do Denatran. “Embora o número de mortes e internações decorrentes de acidentes envolvendo motoristas alcoolizados tenha caído em mais de 23% nos últimos anos, é necessária uma intensificação da fiscalização”, afimou em nota. O departamento acrescenta que investir na educação no trânsito é primordial, pois as sanções já estão em patamares bem severos, mas a educação do condutor é o que, no final das contas, resulta na redução dos altos índices de acidentalidade e mortalidade ainda existentes.

O Brasil é considerado um dos países mais rigorosos em relação ao álcool e direção. De acordo com o último relatório feito pela ONU, em 2015, o país é o único entre os mais populosos que tem leis para direção sob efeitos do álcool, uso obrigatório de capacetes, cintos de segurança e cadeirinha para crianças. Ainda assim, o relatório mostra que somos o quarto país da América com mais mortes no trânsito.

Por isso, Maxwell Vieira, diretor-presidente do Detran de São Paulo, acha que a lei ainda poderia ser mais dura. “A nossa penalidade ainda é muito leve e não é aplicada como deveria. Por isso, o motorista não tem, efetivamente, receio de desrespeitar a lei de trânsito”.

No estado de São Paulo, de 2008 a outubro de 2017 foram aplicadas 244.929 multas decorrentes do uso do álcool antes de dirigir, de acordo com dados do Detran SP. Esses números são resultados do Programa Direção Segura e das operações rotineiras da Polícia Militar do estado, além da fiscalização nas rodovias. E para se ter uma noção do aumento no número de multas aplicadas em cada ano, em 2008, foram 11.724 contra 43.234 de 2017.

No estado com a maior frota do país, são 29.464.998 carros registrados, as fiscalizações da Lei Seca são feitas praticamente todos os dias no estado que abriga a maior frota do país. “Agora, na Copa do Mundo, estamos fazendo durante os trinta dias blitz da Polícia Militar e da Direção Segura”, afirma Maxwell.

Histórico da Lei Seca

Em 1997, o Código de Trânsito Brasileiro permitia a presença de até 0,6 g/L de álcool no sangue do motorista e 0,3 mg/L no bafômetro. A multa para quem ultrapassasse isso era considerava gravíssima, e o valor de R$ 955 era multiplicada por cinco. Além disso, a carteira de habilitação do infrator era suspensa por um ano. Naquela época,dirigir sob efeito de álcool e expor outras pessoas ao perigo era considerado um crime e podia render de 3 a 6 meses de prisão.

Com a aprovação da Lei Seca, em junho de 2008, a tolerância de concentração de álcool diminuiu para 0,2 g/L no sangue e 0,1 mg/L no bafômetro. A multa permaneceu amesma, mas em caso de reincidência no período de ano, ela seria dobrada. A penalização permaneceu: a concentração alcoólica a partir de 0,6 g/L no sangue ou 0,34 mg,L no bafômetro renderia o mesmo tempo de prisão.

Em 2012, a legislação ficou mais rigorosa. Toda e qualquer concentração de álcool no sangue ou no bafômetro passou a ser considerada infração. A multa considerada gravíssima também aumentou: R$ 1.915 e poderia ser multiplicada por 10, além da penalização em dobro se houvesse reincidência. A partir de então, era necessário mais do que o exame clínico, precisa também de prova testemunhal ou imagens de sinais de alteração na capacidade motora. O tempo de prisão foi mantido.

Em 2016, a lei ficou ainda mais dura. O valor da multa subiu para R$ 2.934,70 e a recusa do bafômetro passou a ser considerada penalidade. Este ano, a punição para motoristas bêbados envolvidos em acidentes com morte também ficou mais rígida . Nos casos de homicídio culposo (sem a intenção de matar), a pena mínima de prisão agora é de 5 para 8 anos. Além disso, apenas um juiz poderá decidir pela liberdade ou não do motorista quando houver pedido de habeas corpus.

Melhorias e conscientização

Uma das iniciativas do Departamento Nacional de Trânsito para aumentar a rede responsável por aplicar a lei é integrar os municípios ao Sistema Nacional de Trânsito: “Colocar os municípios como corresponsáveis nessa batalha pela vida aumenta consideravelmente as chances de resultados ainda melhores, uma vez que dentro das vias urbanas está o maior índice de acidentes dessa natureza [por embriaguez]”.

Em nota, o próprio departamento reconhece que ainda é preciso melhorar. “Entendemos que as fiscalizações são realizadas com pouca frequência, gerando uma sensação de impunidade em alguns locais, como por exemplo, nas cidades interioranas dos estados”.

De acordo com um estudo realizado com 53.034 pessoas maiores de 18 anos pelo Vigitel, que compõe o sistema de Vigilância de Fatores de Risco para doenças crônicas não transmissíveis do Ministério da Saúde, de 2011 a 2017, a frequência de adultos que admitem conduzir veículos motorizados após terem ingerido qualquer tipo de bebida alcóolica aumentou 16% em todo o país.

Para fugir das fiscalizações, muitos motoristas usam aplicativos de navegação e trânsito, como o Waze, onde os usuários avisam uns aos outros sobre a ocorrência de blitz. Sobre isso, o diretor-presidente do Detran de São Paulo Maxwell Vieira, chama atenção para a responsabilidade dos cidadões na redução das mortes no trânsito. “Não pode existir um aplicativo que avise as pessoas onde está ocorrendo uma blitz. É preciso lembrar que um esse tipo de motorista pode vir a matar um familiar seu”.

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AGÊNCIA CMI
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